Friday, February 25, 2011

"Isto"

Já passaram bastantes horas, mas não é, particularmente, tarde; mesmo que os relógios indiquem o contrário. Mas para mim nunca será tarde para descer aos confins da terra e passear sobre tudo isto. "O que é tudo isto?" muitos se poderão questionar, não serão assim tantos, talvez os conte pelos dedos. Isto é algo profundo, é estritamente pessoal e fidelizado, isto é um local de memórias, de lágrimas e de sorrisos, de jardins florescidos, de raízes que perduram, de imagens e símbolos cravados nas paredes da transição. Só sabe quem por lá passou, pois são coisas que não se esquecem, que a cumplicidade não deixa de existir quando por breves momentos descemos a este lugar. A isto... onde paira a simplicidade, onde podemos sentir, num segundo, um porto seguro, um aconchego. Isto é importante... e poderia ser perfeitamente mais uma, das inúmeras paredes, que nos rodeiam.

Saturday, February 19, 2011

Era uma vez uma criança igual a mim...

"Havias muitas vezes em que se dispunha a pensar na qualidade das suas sensações e dava conta do peso que algumas pessoas tinham na sua vida, contudo não era muito de grandes demonstrações, quanto mais pesado, menos exuberante, quanto mais leve, mais espontaneamente natural. Sempre foi especialista em guardar emoções, arrumando-as em caixinhas em miniatura algures dentro de si. Espaço não lhe faltava, gostava sempre de acreditar que lhe tinham enchido em demasia o seu coração à nascença, imaginando um grande balão, sem ar, como uma grande superfície sem gravidade, do género lunar, com memórias e sorrisos a levitar no seu interior."
Sim, Eu.

Wednesday, February 16, 2011

Dia de retornar, mais uma vez.

Era tempo de retornar à realidade, de abrir os olhos e alcançar novas perspectivas. Naquela altura já me dirigia com menos frequência à enfermaria mas a cumplicidade ia sobrevivendo ao assédio do desgaste temporal onde nos encontrávamos, onde nos dissuadíamos, conjuntamente, a aspirar algo mais.

Recordo-me, perfeitamente, daquela noite, a sonolência teimava em fugir do horizonte e das insónias tumultuosas ergui-me do chão, caminhei pela terra húmida, subi uma escadaria de madeira rangente e instalei-me comodamente na soturna sala de convívio. Tudo era escuro, sentia-me mais natural se assim fosse, apenas um ponto incandescente alaranjado a brilhar entre dedos não visíveis, a voz da solidão.

Vivi vinte e muitos anos daqueles, de silêncio, de pensamentos em cadeia a envolverem-se no meu raciocínio. Chamar-me-ia complexo, um exagero do domínio da ciência psíquica que dispensava os domínios da facilidade, aqueles que descrevem uma convivência mais fácil connosco se ditarmos uma prévia exclusão de pensamentos excedentários várias vezes ao dia. E pensava nisso com bastante frequência, talvez, por isso, nunca deixasse de lado o acto de pensar.

Um, dois, três… Não sei, ao certo, quantos cigarros se destruíram naquela sala. Cheguei ao idealismo, desconfigurado, de os acender e apagar sem dar conta de nada. Estava, assumidamente, compenetrado na atmosfera e por mais bizarro que se possa pensar sentia-me de corpo e alma naquele espaço e a deslocar-me, provisoriamente, para casa. Deixara o holocausto do retrocesso para trás e vivia num mundo aparte, onde os seus idealismos clandestinos me ofereceram uma nova oportunidade de vida. No entanto continuava no mesmo local, pintado de escuro, sentado naquele sofá de pele, que da cor não me recordo, ou melhor, nem daria para recordar. Lá fora surgiam os habituais movimentos dos noctívagos mas havia algo mais e isso despertou-me e colocou-me em alerta sentido.

Ao longe ouviam-se tropas a marchar, os passos rastejantes eram mais que marcantes e iam anunciando o domínio da guerra e os desejos ameaçadores do inimigo.

M.M.