Monday, August 27, 2012

Rodion Raskólnikov

"De repente, surgiu junto dele a Sónia. Aproximou-se de mansinho e sentou-se. Raiava a manhã, o friozinho da madrugada ainda não se fora embora. Sónia vestia a velha capa e o lenço verde. Ainda tinha no rosto os sinais da doença, mais magra ainda, mais pálida. Sorriu para ele, afável e alegremente, mas, como de costume, foi com timidez que lhe estendeu a mão. 
Estendia-lhe sempre a mão timidamente, às vezes nem se atrevia a fazê-lo, como medo que ele a rejeitasse. E Raskólnikov pegava-lhe sempre na mão com repugnância, era com um ar aborrecido que a recebia sempre, às vezes ficava teimosamente calado durante a visita. Sónia tinha-lhe medo e ia embora magoada. Mas hoje não, as mãos deles não se separaram; Raskólnikov lançou-lhe um olhar rápido de soslaio, não disse nada e baixou os olhos. Estavam sozinhos, ninguém a vê-los, o guarda tinha-lhes virado as costas. 
Como aquilo aconteceu, nem ele próprio sabia, mas uma força qualquer como que o levantou e o arremessou aos pés dela. Chorava e abraçava os seus joelhos. No primeiro momento, Sónia assustou-se terrivelmente, ficou lívida. Mas, num relâmpago, logo percebeu tudo. Nos olhos dela raiou uma felicidade infinita: percebera, já não tinha dúvidas, ele amava-a, amava-a perdidamente, chegara finalmente o instante..."

Raskólnikov é das personagens mais sinistras e maravilhosas que já li. Mais de 500 páginas num profundo combate intelectual, com pensamentos obscuros e melancólicos. Chegamos a entrar na névoa de São Petesburgo, caminhar a seu lado, ouvir os seus passos e sentir um pouco daquela nuvem negra que sempre o acompanha. No fim há uma salvação do homem que parecia perdido, Sonetchka foi mais forte e teve a sua sorte devolvendo a um homem desfeito um pouco de vida. São Petesburgo tornou-se depois isto um destino fundamental no futuro; a cidade que Dostoyevsky considerou ser a "A cidade mais abstracta e intencional do mundo.".

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